Ou ele ou eu

Jörn Kaspuhl
Estávamos dividindo o mesmo elevador. Ele lá e eu cá. Alguns o observavam segurando o riso, outros fingiram não o ver, para que não houvesse a menor possibilidade de um assunto sem nexo ser puxado. Era uma figura excêntrica, intrigante e vestia-se de forma inadequada para o ambiente. Louco. E são esses loucos quem mais me chamam atenção.



Eu ainda acredito na humanidade, apesar de achar que há seres que habitam o nosso planeta que deveriam estar em outro, anos-luz longe daqui, de preferência em um local inóspito com o direito apenas de obter oxigênio. Ou não. Mas temos os loucos. E são esses que me causam um certo estranhamento e ao mesmo tempo curiosidade. Em um bom português, fascínio. Quem são eles, afinal? Serão os loucos tão desprezíveis assim ou seriam eles algo muito além do que podemos compreender?
Penso se um dia, fora da matrix, descubramos que os loucos são os normais e os normais são os diferentes, que tragédia que não seria percebermos que nosso modo robô-correto-na-sociedade seja um indício de insanidade. Sim, insanos, pois vivemos com medo de não encaixarmos em um padrão estruturado pré-determinado. Não seria o padrão algo fora do padrão? E se fizéssemos o que gostaríamos de fazer? E se obtêssemos a liberdade, nem que fosse por um dia?
O elevador abriu suas portas e um olhar simpático do louco adentrou minha alma, como se respondesse a mim tudo o que eu havia pensado nesse curto espaço de tempo. Querida jovem, você não pediu pra nascer e ainda lhe fazem exigências?

A porta fechou-se e nunca mais o vi.

O confuso ser confuso

 

Eu tenho um problema sério com organização. Não sei se chega a ser um TOC, metodismo demais ou todas as respostas anteriores. Durante todas as minhas graduações, mudo constantemente meu método de registrar as aulas em busca do perfeito. Quem nunca se perguntou se usaria caderno ou fichário, que atire o primeiro apagador. É normal pensarmos qual será o melhor método que iremos utilizar para anotar aulas durante um curso, mas quando isso perdura durante todo ele, é sinal de que há um parafuso a menos.

No Camilando escrevi, há uns anos – acho que em 2010 – que havia encontrado um médoto perfeito para isso: um caderno-fichário. Mentira. Minha solução durou até descobrir que aqueles botões de fechar o envoltório me irritavam e não permitiam deixa-lo aberto sem que houvesse uma morsa por baixo da contracapa. Isso me desconcertou.
Parti então para o netbook. Era legal usa-lo até que passei a pegar o ônibus cheio de pivetes, no qual eu sempre enfiava uma nota de 10 reais dentro do bolso da calça disfarçadamente para o caso de ser assaltada, ter pelo menos o dinheiro pra volta. Passei então a usar folhas de fichário e uma pasta sanfona pra frequentar as aulas da UERJ. A pasta foi ficando cada vez mais pesada e as esticadas pós-aula no bar do Cicinho não me permitiam manter um trambolho daqueles pra tomar conta. Já tinha que cuidar da minha carteira e dos 10 reais do bolso.
Mudei para o caderno. Que maravilha folhear um de 200 páginas todo escrito bonitinho, organizado com canetas coloridas respeitando metodicamente a diagramação. O problema é que o desgraçado não cabe nas bolsas e novamente tenho que tomar conta de um indivíduo chato, irritante, que além de tudo, não possui nada pra protege-lo. Uma simples queda no chão e lá se vão todas aquelas folhas soltas pelo hall dos elevadores da UERJ justamente no momento em que o elevador chega. Quem estuda lá sabe que se perder o elevador das 11 horas, só amanhã de manhã.
Agora me decidi. Comprei uma pasta catálogo transparente – para dar um ar de organização e limpeza – e coloquei todas as minhas folhas. Passei à limpo minhas 3 semanas de aula [not too much things] e ela está aqui, linda, perfeita, organizada. Para isso usei um bloco de folhas de fichário que encontrei guardado. Acho que encontrei a solução definitiva para todos os meus problemas, mas não sei por quanto tempo esse meu definitivo vai durar. Quem me conhece sabe, mudança é meu sobrenome. Aliás, acho que isso é minha única característica que não muda.

Quem é essa tal natureza?

Nata Metlukh
Quem é a natureza tão falada nos jornais impressos de grande circulação? Temos que preservar a natureza, cuidar da natureza, mas nem sempre estamos próximos desse ser de quem os artigos falam. Nosso mundinho hiperconectado nos afasta cada vez mais do modo de vida natural, do primitivo. Mesmo fugindo nos finais de semana para o campo e praia, a natureza permanece como algo externo, intacto, a qual só temos real contato nas notícias. “Diga não ao desmatamento da Amazônia”. Mas nem sabemos onde fica! Não é aqui no meu quintal, não fará diferença alguma para mim. Enquanto eu tiver minha luz, minha internet, meu conforto do ar condicionado no meu apartamento na cidade maravilhosa, nada que acontece lá fora me atinge. Faltou luz? Que pena, fiquei sem conectar no meu Facebook! O que será de mim?
Geralmente não compreendemos a natureza como parte de nós mesmos, e por isso o bombardeamento excessivo de informações sobre sustentabilidade e consciência ambiental pode nos trazer o resultado oposto. A dessensibilização ocorre no momento em que ouvimos e lemos de forma excessiva sobre um tema que nos tornamos alheios. Isso não acontece só com esse tema, mas também com a violência. Ler nos jornais logo de manhã que pessoas inocentes morreram em um tiroteio já não choca tanto como antes. Estamos anestesiados com esse fenômeno, e quanto mais tocamos na mesma tecla, menos o trágico faz a diferença em nossas vidas.
Você já fez algo pelo meio ambiente? Não deixe a torneira aberta enquanto escova os dentes, reduza o consumo de luz e água, economize, não use sacolas plásticas, pois os peixes no fundo do oceano podem morrer asfixiados. Desculpe, mas eu não sou um peixe no oceano, sequer sei aonde fica a Amazônia, tampouco sei quem é esse tal de meio ambiente. Prefiro manter meus hábitos, sempre vivi assim e é muito mais cômodo. Uma pena que essa é a realidade de milhares de brasileiros. A natureza, no entanto, está longe de ser algo extrínseco a nós. Ela faz parte de nós. Ou melhor, nós fazemos parte dela. Cuidar do meio em que vivemos é, no mínimo, inteligente e compõe o instinto de sobrevivência. A pós-modernidade nos trouxe avanços tecnológicos excelentes, mas com ela também veio o imediatismo, a falta de planejamento à longo prazo e o consumo desenfreado. Enquanto não percebermos que somos parte integrante do meio em que vivemos, continuaremos predestinados a nossa própria sorte. Lamentável que pensemos que o que importa é o agora.
Uma pesquisa da GlobeScan mostrou o declínio da preocupação ambiental nos últimos anos. Isso pode estar também associado à massificação e repetição do assunto na mídia, além do uso incorreto e inconsequente da imagem ambiental, a qual é utilizada por bancos, empresas e produtos que nada têm de ecológico. Como um banco é ecológico? A imagem da questão ambiental nos jornais está saturada. Hoje, tudo é verde, mesmo que não haja nenhuma preocupação ambiental nas empresas. Clientes buscam por esse diferencial achando que já estão cumprindo seus papeis, mas na verdade estão caindo apenas na lábia do marketing. Estamos fazendo muito pouco, ainda falta o governo tomar medidas mais rígidas sobre o controle ambiental, para que possamos fazer planos mais eficientes, mas parece que não é de interesse deles. O difícil é saber se a população ainda está em um ponto em que há retorno ou seus ouvidos já não se sensibilizam mais com o grito de socorro da natureza. Afinal, quem é essa tal natureza a qual todos pedem para preservar, mas poucos são aqueles que realmente tomam medidas dentro de sua própria comunidade e residência para fazer a sua parte?
Precisamos de uma nova estratégia, pois acho que essa, da repetição, está falhando. A massificação da mídia talvez não seja o melhor caminho. Qual caminho devemos escolher, afinal? Como fazer uma educação ambiental de sucesso sem que o termo “conscientização ambiental” sofra desgaste? É hora de pensar nisso, pois amanhã pode ser tarde demais.